Mulheres vítimas de violência, integrantes de organizações da sociedade civil e de diferentes instâncias do Poder Público se reuniram nesta sexta-feira (25/06), na Câmara Municipal do Rio, para discutir o combate à violência contra as mulheres na cidade. O encontro, iniciativa da Comissão de Defesa da Mulher, presidida pela vereadora Veronica Costa (DEM), contou com uma pauta que foi desde informações sobre como proceder em casos de violência doméstica até a discussão sobre a melhoria de políticas públicas voltadas para o público feminino.
A vereadora Veronica Costa conduziu a reunião e deu um panorama da situação da violência doméstica atualmente com a apresentação de alguns números. “A violência contra a mulher é uma realidade brutal para grande parte das mulheres. Segundo o site Maria da Penha, a cada dois minutos uma mulher é vítima de violência doméstica no Brasil. Dados do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, dos canais Disque 100 e Disque 180, afirmam que o Brasil teve 12 denúncias por hora de violência contra a mulher no ano passado. Os números são alarmantes e espantosos”, enfatizou a parlamentar que deu o relato de uma experiência pessoal. Ela contou que a sua mãe foi vítima de agressões do seu padrasto.
Vogal da Comissão de Defesa da Mulher, o vereador Eliel do Carmo (Democracia Cristã), mostrou indignação com esses números e falou da sua percepção. “Parece que as notícias são gravadas e repetidas. Todo dia a gente tem um caso de violência contra a mulher, um feminicídio, que é uma morte, uma agressão. Isso não pode ser comum. Isso não pode virar normal no seio da sociedade.”
Com a pandemia, as estatísticas relativas à violência contra a mulher apresentaram uma piora. É o que apontou a coordenadora de Políticas para Mulheres da Defensoria do Estado do Rio de Janeiro, Flávia Nascimento. “Nesse período da pandemia, assim como outros serviços da rede, a Defensoria Pública teve que readaptar toda a sua metodologia de trabalho. De início, nós passamos a realizar atendimentos exclusivamente remotos através de whatsapp e email. E, por fim, a Defensoria Pública lançou um aplicativo e vem realizando os atendimentos também pelo app. Durante o período de maior isolamento social, o nosso núcleo de Defesa dos Direitos da Mulher Vítima de Violência de Gênero constatou um aumento progressivo dos atendimentos diários chegando a ultrapassar o número de atendimentos que era realizado de forma presencial”, destacou.
Políticas públicas mais efetivas
Todos os participantes da audiência foram unânimes na ideia de que a construção contínua de políticas públicas para dar suporte às mulheres vítimas de violência doméstica é fundamental. A vice-presidente da Comissão de Defesa da Mulher, a vereadora Monica Benicio (PSOL), destacou que é preciso ir além da assistência jurídica e emocional com uma maior presença do Estado. “Ouvimos os relatos de diversas organizações de mulheres sobre o aumento da procura de ajuda e ainda a dificuldade de ter acesso aos serviços. É preciso pensarmos em políticas públicas que permitam que as mulheres tenham autonomia financeira e social para viverem livres de violência e que garantam a proteção das mulheres ao denunciar suas situações de violência. O Estado tem que ter responsabilidade com a vida das mulheres.”
A major Bianca Neves, oficial de ligação da PM na Patrulha Maria da Penha, em que as forças de segurança agem de forma ativa contra a violência, destacou que as políticas públicas para mulheres devem chegar também para as moradoras de comunidades. “A gente sabe que na comunidade há um grande paradigma que precisa ser quebrado. As mulheres não têm esse perfil de denunciar por várias questões, inclusive por questões de conhecimento, é muito importante a gente enfatizar isso. Nós precisamos mostrar e levar isso para essas mulheres. Estamos com uma proposta de levar palestras para dentro das comunidades. No dia 20 de julho será a primeira palestra, dentro da UPP da Vila Cruzeiro”, adiantou.
A Patrulha Maria da Penha completa dois anos de existência no próximo dia 5 de agosto. De acordo com a major, em 2020 foram realizados 39.766 atendimentos diretos da patrulha a mulheres vítimas de violência em todo o estado.
A diretora de Mulheres da OAB - RJ (Ordem dos Advogados do Brasil), Marisa Gaudio, apresentou sugestões a respeito das políticas públicas pensadas para mulheres, como a “Sala Lilás”, onde mulheres têm atendimento humanizado ao necessitar de perícias e exames no IML. “As advogadas pontuaram alguns problemas no cumprimento de medidas protetivas, principalmente quanto à prisão devido ao descumprimento da medida; o ponto 2 é ter um núcleo de gênero na DRCI (Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática) devido a quantidade de crimes com a questão de gênero por trás; um terceiro ponto é a manutenção das salas lilás, em especial Campo Grande, e a criação de novas salas lilás; o quarto ponto é a capacitação de todos que lidam com mulheres em situação de violência; em quinto lugar a conscientização sobre a violência contra a mulher na educação do Rio de Janeiro, nas escolas e faculdades; e por último, mas não menos importante, a capacitação profissional de mulheres vítimas e incentivo a empresas a dedicarem vagas para essas mulheres.”
Depoimentos de mulheres vítimas de violência
A delegada Mônica Areal, que atua na Delegacia de Atendimento à Mulher, levou ao plenário da Câmara do Rio duas vítimas de casos que ela acompanhou de perto. Para a delegada, a proximidade com o agressor é um dos principais complicadores desse tipo de crime. “A vítima da violência doméstica não é uma vítima comum. Ela não é aquela que nunca mais vai ver o agressor.”
Uma das vítimas que fez um relato foi a Priscila Lacerda. Ela foi espancada pelo marido na frente dos filhos e dos sogros, e chegou a ficar internada. Ela reconhece o processo doloroso, mas encoraja outras mulheres porque a denúncia é necessária. “Eu encorajo as mulheres q tem medo e não tem coragem de denunciar e mudar de vida. Hoje em dia o processo está se findando, dois anos depois, e ele foi condenado.” Muito emocionada, Cláudia Bentes também deu um forte depoimento. Ela ficou em cárcere privado por oito anos com o filho. Ambos eram vítimas de violência.
Hoje, há vários canais de denúncias e muitos deles são online. A juíza Adriana Mello, do 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Capital, falou sobre uma iniciativa recente da instituição para ajudar no acesso de mulheres à Justiça. “O projeto Maria da Penha virtual, que só está em vigor no município do Rio, é justamente para a mulher pedir a medida protetiva de urgência diretamente ao juiz ou à juíza sem necessidade do registro policial.”
Ainda participaram da audiência pública a MC Kátia Fiel, que fechou a reunião cantando uma música que fez para conscientizar os homens; a vereadora Teresa Bergher (Cidadania); a tenente-coronel Claudia Moraes, idealizadora da Patrulha Maria da Penha; a procuradora de Justiça Carla Araújo, do Centro de Apoio Operacional de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher no Ministério Público do Rio de Janeiro; a advogada Fabiana Marques, da Comissão de Direitos da Mulher do Instituto Brasileiro de Pesquisa e Estudo Jurídico; e a advogada Wanessa Ribeiro, presidente da Comissão da Mulher da Associação Brasileira de Criminalistas.